Tesi etd-01032022-113916 |
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Tipo di tesi
Tesi di laurea magistrale
Autore
FALCICCHIO, ELISABETTA
URN
etd-01032022-113916
Titolo
Ensaiar novas escritas: repensar a Historia através da Literatura.
As areias do Imperador de Mia Couto e o "novo" romance estórico
Dipartimento
FILOLOGIA, LETTERATURA E LINGUISTICA
Corso di studi
LINGUISTICA E TRADUZIONE
Relatori
relatore Prof.ssa Tocco, Valeria
controrelatore Prof.ssa Lupetti, Monica
controrelatore Prof.ssa Lupetti, Monica
Parole chiave
- As areias do imperador
- estória
- Gungunhana
- história
- literatura
- Mia Couto
- Moçambique
- romance histórico
Data inizio appello
31/01/2022
Consultabilità
Non consultabile
Data di rilascio
31/01/2092
Riassunto
História e Literatura são habitualmente apresentadas como disciplinas contrapostas: o caracter científico que se atribui frequentemente à História faz com que o discurso historiográfico seja afastado daquela essência narrativa que, pelo contrário, caracteriza a Literatura, inerentemente ficcional. Os fatos históricos, com efeito, são relacionados com a ideia de verdade, na medida em que (presumivelmente) sejam reflexo daquilo que “realmente” aconteceu. Contudo, a representação da História é sujeita, na mesma, à uma interpretação dos eventos históricos, intrinsecamente neutros. Isso significa que o relato da historiografia é objetivo apenas em aparência – exclusivamente porque relacionado a uma suposição aceite pela “maioria” –, na medida em que, na prática, é o resultado duma das possíveis especulações empreendida pelo historiador.
Desta maneira, conforme a intuição de Hayden White – cujo trabalho Forme di Storia (2006) é tomado como ponto de partida da minha reflexão –, a História, na realidade, é igualmente narrativa, porque construída a partir daqueles mesmos elementos que é possível encontrar dentro da estrutura dum discurso literário: o historiador, com efeito, é chamado a organizar o material histórico (os eventos) de acordo com uma “estrutura de enredo” adequada à demanda da dimensão espácio-temporal em que opera; portanto, trata-se duma interpretação sim subjetiva, mas, duma certa forma, ainda subordinada a uma ideia objetiva daquilo que aconteceu: dessa maneira, é confirmada a tese de Agustina Bessa-Luís (1922-2019), segundo a qual «a História é uma ficção controlada».
Este “controlo” da História por parte de quem precisa utilizá-la à própria vantagem – habitualmente as pessoas no poder – fiz com que, muitas vezes, o relato oficial esquecesse aspetos julgados inconvenientes para realizar determinadas agendas políticas, originando, ao longo do tempo, versões “amnésticas” da História. Sobretudo num contexto como o da África pós-colonial – cenário desse trabalho – reavaliar os preceitos até do discurso histórico proporciona-se como uma necessidade para a afirmação duma identidade autónoma até então assente nas dicotomias opositivas Europa/Africa, branco/negro, colonizador/colonizado. Países como a ex-colónias africanas – Moçambique nesse caso específico – de facto, não encontram representações legítimas numa História escrita, pela maioria das vezes, por mãos alheias (leia-se, europeias) e, mesmo quando se tentou reelaborar uma História mais “africana”, durante aquela fase denominada de resistência, caiu-se num excesso de nacionalismo que ocultou, ao mesmo modo, as vozes de quem a História a vivenciou em primeira pessoa.
No caso dos países africanos, portanto, como explicado no capítulo 1 desse trabalho, dedicado inteiramente a uma descrição do contexto em que surgiram e se consolidaram as literaturas africanas em geral e a moçambicana em particular, o discurso literário não pode prescindir da interação com o discurso histórico na medida em que conhecer as condições históricas em que começaram a tomar forma essas literaturas é fundamental para compreender os seus andamentos. Ver-se-á que a Literatura, por conseguinte, adquire o papel indiscutível de instrumento privilegiado para repensar a História, graças ao seu mais amplo campo de ação determinado pelo ofício da imaginação, legitimando assim versões da História que o discurso oficial renegou ou esqueceu.
Esse princípio guia a trilogia histórica As areias do Imperador – Mulheres de Cinza (2015), A Espada e a Azagaia (2016), O Bebedor de Horizontes (2018) – de Mia Couto, escolhida como matéria de estudo do presente trabalho. O escritor moçambicano tenta oferecer uma versão “nova” dum momento histórico que se tornou parte, ao mesmo tempo, da mitologia nacional portuguesa e moçambicana, isto é, a queda do império de Gungunhana, o último imperador do grande reino de Gaza. No capítulo 2, tentar-se-á apresentar, duma forma contrastiva, a maneira como o “Leão de Gaza” foi representado pelo discurso histórico oficial português e moçambicano: no primeiro caso, de facto, a derrota do grande imperador foi o excelente pretexto para Portugal dar prova de merecer o título de potência europeia, num momento histórico (finais do século XIX) em que tinha perdido a grande fama adquirida na época dos Descobrimentos; doutro, pelo contrário, o mesmo mito foi explorado para ressaltar a resiliência do povo moçambicano, durante aquele período de construção e consolidação da Nação moçambicana pós-independente. As duas representações, portanto, são o resultado duma modelação – ou, talvez, distorção – dos eventos históricos, apresentados conforme as necessidades políticas de ambos os lados, os quais negligenciaram relatos privados de quem, na realidade, participou primeiramente na própria História. Aqui se insere a obra de Mia Couto, a qual parece encher os interstícios deixados brancos pelo discurso oficial: a História é, assim, questionada e revista no seu carácter mítico. O resultado é um discurso histórico que, por meio da literatura, confirma a necessidade de libertar a mesma Historia dum colonialismo “branco” ou “negro” que seja, de modo que essa se torne, simplesmente, moçambicana. A mesma necessidade é sentida até nas formas como o próprio discurso é apresentado: em âmbito genológico é consequência e, ao mesmo tempo, exigência, produzir géneros literários que sejam representativos da mundividência africana que encontra a sua melhor representação na “tradição” oral. Dai a revisitação – que por Mia Couto é involuntária – do género do romance histórico, resultado duma interdiscursividade entre escrita e oralidade que abala até a epistemologia eurocêntrica na base do género literário em questão. Evidenciar-se-á como o género da estória, nos termos de João Guimarães Rosa, torna-se unidade fabular independente sobre o qual todo o romance se erige. Depois, evidenciar-se-á com exemplos concretos como, dentro das narrativas miacoutianas, oralidade e escrita entrelaçam-se a diversos níveis, já a partir da unidade mínima da palavra atingindo até a estrutura inteira do texto.
O terceiro e último capítulo é dedicado inteiramente à reflexão tadutológica acerca dos primeiros dez capítulos do volume I da trilogia em exame que também aqui se encontra. Focalizar-se-á a atenção sobre dois grandes desafios encontrados ao longo do processo tradutivo: a tradução das formas de tratamento – o que permitiu também realizar uma pequena reflexão sobre o caracter pluricêntrico da língua portuguesa – e a tradução dos realia, acompanhada, por sua vez, por umas considerações sobre a importância de reconhecer aquela peculiaridade linguística que caracteriza a ainda não normatizada variante africana do português.
Desta maneira, conforme a intuição de Hayden White – cujo trabalho Forme di Storia (2006) é tomado como ponto de partida da minha reflexão –, a História, na realidade, é igualmente narrativa, porque construída a partir daqueles mesmos elementos que é possível encontrar dentro da estrutura dum discurso literário: o historiador, com efeito, é chamado a organizar o material histórico (os eventos) de acordo com uma “estrutura de enredo” adequada à demanda da dimensão espácio-temporal em que opera; portanto, trata-se duma interpretação sim subjetiva, mas, duma certa forma, ainda subordinada a uma ideia objetiva daquilo que aconteceu: dessa maneira, é confirmada a tese de Agustina Bessa-Luís (1922-2019), segundo a qual «a História é uma ficção controlada».
Este “controlo” da História por parte de quem precisa utilizá-la à própria vantagem – habitualmente as pessoas no poder – fiz com que, muitas vezes, o relato oficial esquecesse aspetos julgados inconvenientes para realizar determinadas agendas políticas, originando, ao longo do tempo, versões “amnésticas” da História. Sobretudo num contexto como o da África pós-colonial – cenário desse trabalho – reavaliar os preceitos até do discurso histórico proporciona-se como uma necessidade para a afirmação duma identidade autónoma até então assente nas dicotomias opositivas Europa/Africa, branco/negro, colonizador/colonizado. Países como a ex-colónias africanas – Moçambique nesse caso específico – de facto, não encontram representações legítimas numa História escrita, pela maioria das vezes, por mãos alheias (leia-se, europeias) e, mesmo quando se tentou reelaborar uma História mais “africana”, durante aquela fase denominada de resistência, caiu-se num excesso de nacionalismo que ocultou, ao mesmo modo, as vozes de quem a História a vivenciou em primeira pessoa.
No caso dos países africanos, portanto, como explicado no capítulo 1 desse trabalho, dedicado inteiramente a uma descrição do contexto em que surgiram e se consolidaram as literaturas africanas em geral e a moçambicana em particular, o discurso literário não pode prescindir da interação com o discurso histórico na medida em que conhecer as condições históricas em que começaram a tomar forma essas literaturas é fundamental para compreender os seus andamentos. Ver-se-á que a Literatura, por conseguinte, adquire o papel indiscutível de instrumento privilegiado para repensar a História, graças ao seu mais amplo campo de ação determinado pelo ofício da imaginação, legitimando assim versões da História que o discurso oficial renegou ou esqueceu.
Esse princípio guia a trilogia histórica As areias do Imperador – Mulheres de Cinza (2015), A Espada e a Azagaia (2016), O Bebedor de Horizontes (2018) – de Mia Couto, escolhida como matéria de estudo do presente trabalho. O escritor moçambicano tenta oferecer uma versão “nova” dum momento histórico que se tornou parte, ao mesmo tempo, da mitologia nacional portuguesa e moçambicana, isto é, a queda do império de Gungunhana, o último imperador do grande reino de Gaza. No capítulo 2, tentar-se-á apresentar, duma forma contrastiva, a maneira como o “Leão de Gaza” foi representado pelo discurso histórico oficial português e moçambicano: no primeiro caso, de facto, a derrota do grande imperador foi o excelente pretexto para Portugal dar prova de merecer o título de potência europeia, num momento histórico (finais do século XIX) em que tinha perdido a grande fama adquirida na época dos Descobrimentos; doutro, pelo contrário, o mesmo mito foi explorado para ressaltar a resiliência do povo moçambicano, durante aquele período de construção e consolidação da Nação moçambicana pós-independente. As duas representações, portanto, são o resultado duma modelação – ou, talvez, distorção – dos eventos históricos, apresentados conforme as necessidades políticas de ambos os lados, os quais negligenciaram relatos privados de quem, na realidade, participou primeiramente na própria História. Aqui se insere a obra de Mia Couto, a qual parece encher os interstícios deixados brancos pelo discurso oficial: a História é, assim, questionada e revista no seu carácter mítico. O resultado é um discurso histórico que, por meio da literatura, confirma a necessidade de libertar a mesma Historia dum colonialismo “branco” ou “negro” que seja, de modo que essa se torne, simplesmente, moçambicana. A mesma necessidade é sentida até nas formas como o próprio discurso é apresentado: em âmbito genológico é consequência e, ao mesmo tempo, exigência, produzir géneros literários que sejam representativos da mundividência africana que encontra a sua melhor representação na “tradição” oral. Dai a revisitação – que por Mia Couto é involuntária – do género do romance histórico, resultado duma interdiscursividade entre escrita e oralidade que abala até a epistemologia eurocêntrica na base do género literário em questão. Evidenciar-se-á como o género da estória, nos termos de João Guimarães Rosa, torna-se unidade fabular independente sobre o qual todo o romance se erige. Depois, evidenciar-se-á com exemplos concretos como, dentro das narrativas miacoutianas, oralidade e escrita entrelaçam-se a diversos níveis, já a partir da unidade mínima da palavra atingindo até a estrutura inteira do texto.
O terceiro e último capítulo é dedicado inteiramente à reflexão tadutológica acerca dos primeiros dez capítulos do volume I da trilogia em exame que também aqui se encontra. Focalizar-se-á a atenção sobre dois grandes desafios encontrados ao longo do processo tradutivo: a tradução das formas de tratamento – o que permitiu também realizar uma pequena reflexão sobre o caracter pluricêntrico da língua portuguesa – e a tradução dos realia, acompanhada, por sua vez, por umas considerações sobre a importância de reconhecer aquela peculiaridade linguística que caracteriza a ainda não normatizada variante africana do português.
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